21 setembro, 2006

a única que não viu o sol

- Minha senhora, ainda tem o sol?
- O sol já está esgotado, lamento menina. Desde bem manhã-
zinha que se acabou. E do expresso nem me fale!...
Pareceu-lhe que a velhota de olhos míopes e desgrenhados
cabelos, anunciava isso como se tal fosse o fim do mundo, como
se uma imensa e espessa noite tivesse caído desgraçadamente
sobre o mundo.
- Não faz mal nenhum... olhe, ainda bem, porque agora até já
são mais os jornais do que propriamente as notícias...
Não comprou nenhum jornal. Comprou cigarros. Saiu para uma
esplanada sobre o mar. Pediu um expresso. Pôs-se ao sol a curtir
os últimos calores do verão. Sobre a mesa, a caixa dos cigarros
gritava em tom ameaçador que fumar mata. Sentiu que, sub-
-repticiamente, todas as palavras carregam uma espécie de lou-
cura insana. Que bom seria desaprender a ler. Não podia ser,
desfrutar assim da vida não podia matar.
Jurou a si mesma que a partir dali não iria correr atrás de jornais,
não mais prestaria tanta atenção indevida às falsas notícias.
Nem por isso os dias lhe têm corrido menos luminosos.
Até o tal do furacão virou cão mansinho.

4 Comentários:

Blogger feniana disse...

ficou-me cá dentro. onde também se espera sol.

21 setembro, 2006 18:52  
Anonymous Anónimo disse...

"Nem por isso os dias lhe têm corrido menos luminosos."
Sounds like good news to me...

22 setembro, 2006 04:06  
Blogger hfm disse...

O sol da sabedoria iluminando o expresso.

22 setembro, 2006 07:53  
Blogger Filipa disse...

post bonito. inspirou-me. amanhã vou fazer o mesmo!

22 setembro, 2006 15:46  

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