17 setembro, 2009

um bárbaro na índia

"O indiano não é seduzido pela graciosidade dos animais. Oh, não!
Antes os olha de viés.
Não gosta de cães. Não há concentração nos cães. São seres de
primeiro impulso, vergonhosamente desprovidos de autodomínio.
E depois, que significam estes reincarnados todos? Se não tivessem
pecado, não seriam cães. Infectos criminosos, talvez tenham morto
um Brâmane (na Índia, cuidado: evitar ser cão ou viúva).
O hindu aprecia a meditação, a sabedoria. Sente-se de acordo com
a vaca e o elefante, que lá no foro íntimo mantêm a sua ideia e de
algum modo vivem retirados. O hindu gosta dos animais que não
dizem "obrigado" nem fazem demasiadas cabriolas.
Nos campos, não há pardais; há pavões, íbis, aves pernaltas, muitos
corvos e milhafres.
Tudo isso é sério.
Camelos e búfalos de água.
É inútil dizer que o búfalo da água é lento. Só pensa em espojar-se
na lama; o resto não lhe interessa. Atrelado, mesmo em Calcutá,
não irá depressa, oh! não, e passando de vez em quando pelos
dentes a língua fuliginosa, observará a cidade como um sítio onde
se sente perdido.
Quanto ao camelo, é bem superior ao cavalo, orientalmente fa-
lando; um cavalo a trote ou a galope tem sempre o ar de estar a
fazer desporto. Não corre, debate-se. O camelo, pelo contrário,
avança rapidamente com passada harmoniosa.
A propósito de vacas e elefantes, devo dizer uma coisa: não me
agradam os notários. As vacas e os elefantes, animais sem chama,
são notários"


Henri Michaux em "Um Bárbaro na Ásia" (depois de uma viagem pelo
continente asiático encetada em 1931).

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