wanted man
© Coliseu do Porto, Abril 2008
Ainda o Nick Cave. Talvez o músico estrangeiro de renome
que por cá mais vezes tenha tocado. Parece que os jornais,
ou melhor, os críticos de jornais por eles, não gostaram das
recentes prestações em terra lusa. Ao contrário, curiosa-
mente, tanto o público de Lisboa como o do Porto, parece
ter gostado. Se calhar, uns como outros, estarão cheios de
razão...
No "Público", pela pena de João Bonifácio, escreve-se:
«Aceitemos a verdade: o relativamente respeitável senhor
Cave de hoje já não é o anti-cidadão Nick Cave de há uns
anos - e está no seu direito. Tem uma careca, um belo bigode,
a camisa já não é branca e sim preta, não corre pelo
palco, muito menos canta em tronco nu, antes abre quatro,
cinco botões da camisa» e remata a desencantada crónica
com «Para a miudagem (e havia muita) pareceu ter sido
admirável, para os velhotes (e havia muitos) idem: e o
atulhado Coliseu desdobrou-se em apoteoses que musical-
mente não tiveram qualquer justificação. O circo foi caricato,
no entanto.»
No "Jornal de Notícias" o repórter Cristiano Pereira teve
visão muito semelhante: «O homem está mudado. Agora, usa
bigodinho. Raramente se senta ao piano. E até faz questão de
ser ele próprio a tocar guitarra eléctrica. Nick Cave fez 50 anos
em Setembro passado - e a idade modifica as pessoas.» E
termina o seu relato assim: «A ideia que fica é que Cave
deslumbrou os fãs mais recentes, mas que criou divisão nas
opiniões dos admiradores de longa data. Mas a devoção, essa,
permanece inalterável - daqui para a eternidade.»
Entretanto um amigo escreveu-me a dizer que já não tem
muita paciência para as suas canções de suor e lágrimas,
mas que, enquanto estava a trabalhar, se pôs a ouvir os
esquecidos Swans e questionou se não estaremos velhos de
nostalgia, nós os da brava música dos anos oitenta, e isto já sou
eu que digo...
Há vinte anos éramos todos muito mais novos. (Na verdade,
éramos outros). Tudo parecia novo, puro, intenso. Embora,
para muitos de gerações mais velhas, seria, porventura, apenas
uma espécie de música cuspida no mundo por uns tresloucados
barulhentos...
Há vinte anos ainda não havia máquinas digitais, só os
fotógrafos oficiais. Muito menos telefones minúsculos e por-
táteis, miraculosamente capazes de gravar sons e imagens.
Não havia gente tão quieta (e quiçá, por culpa também de
toda essa tecnologia), tanto na plateia como até no palco.
Há vinte anos havia tardios punks e tribos afins aos pulos e
aos empurrões. Há vinte anos as plateias seriam mais homo-
géneas e não tão pavlovianamente exultantes. Há vinte anos
podia-se fumar livremente. Agora o ar é bem mais limpo,
apenas perfumado aqui e ali, por um ou outro charro mais
atrevido.
E há vinte anos havia o Blixa. Hoje, o bigode do Nick Cave
parece ser coisa tão pouco cool...
Mas enfim, apesar de não crer (nem querer) que os Bad Seeds
alguma vez se armarão nuns Rolling Stones, enquanto rodarem
por aí com vontade e gozo, por mim serão sempre uma festa a
celebrar.
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