07 novembro, 2007

mais um dos cem pequenos romances de Manganelli

"QUARENTA"

Entre o fim de domingo e o começo de segunda-feira, ele começa
a dispor a semana entretecendo um subtil, árduo cômputo de
encontros. Em geral, dedica a segunda-feira, dia obtuso, que
aguenta o peso instável de uma semana, a uma das suas amigas
chatas: chama chatas às amigas que não propõem problemas
afectivos, sexuais, intelectuais; que ele poderia, de um dia para o
outro, decidir não voltar a ver, com as quais nunca teve nem
sequer uma inócua fraqueza. As amigas chatas são cinco: duas
sofrem de crises depressivas, uma delas é uma angustiada, a
quarta absolutamente néscia, mas disposta a rir com as suas
piadas, a quinta relativamente equilibrada mas demasiado culta.
As depressivas, quando não estão deprimidas, são, uma, amável e
delicada, submaternal, a segunda, bruscamente comunicativa e
sincera, um pouco amaneirada; a angustiada é óptima, fora a
angústia, cautelosa, ágil, inconsistente, submissa. Vamos supor
que escolhe a angustiada e a encontra disponível. Não pode excluir
uma tardia crise de angústia, e para o dia seguinte fixará dois
encontros - com um amigo caprichoso e generoso, e com uma
mulher pacata e um pouco banal, alheia a crises. Decidirá depois.
Na quarta-feira, gostaria de ver uma mulher que o deseja, mas que
não ama, mas não ousa falar-lhe antes de ter arrumado a quinta-
-feira com uma mulher extremamente consoladora, talvez apaixo-
nada, à qual poderá confiar as inevitáveis angústias do encontro
anterior, qualquer que tenha sido o seu desfecho. A sexta-feira é
masculina: tem três amigos, nenhum deles prestigioso; um, um
pouco inteligente de mais para ele, um outro, infeliz e portanto
inclinado à gratidão, um terceiro, aborrecido porque apaixonado,
justamente não correspondido. No sábado, deverá juntar-se a
uma companhia genérica, que geralmente o acolhe sem fazer caso
dele, mas sem má vontade. É o dia anónimo e basta-lhe não ser
obrigado a dançar. Escolhe, pois, companhias de meia idade. Rara-
mente bebe de mais; não faz novas amizades; não chega tarde a
casa. Espera-o o domingo, o terrível dia do Senhor, se não tivesse
morrido, da família, do sexo. Dada a vacuidade estudou o itinerário
da semana; com o único, premeditado objectivo de adiar a revela-
ção e o suicídio, como faz, pacientemente, desde o dia do nasci-
mento.

do livro "Centúria" (edições 70), de Giorgio Manganelli

3 Comentários:

Blogger hora tardia disse...

bom dia "encontro".






____________.

08 novembro, 2007 08:50  
Blogger francisco carvalho disse...

em boa hora amanhecido com um bom dia tão consolador.
:)

08 novembro, 2007 10:29  
Blogger isabel mendes ferreira disse...

e tão longe que anda...


bem sei que o "palco" cansa...:))))


beijos.


debaixo do sol.


com aplausos.

09 novembro, 2007 08:51  

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