Amigos em Portugal
© 2005
Por estes dias, encontrei o cd "Amigos em Portugal" à venda.
Há quantos anos o procurava! Por inércias várias, minhas e
de amigos meus, ao longo destes anos, nunca consegui passar
para digital esse vinil de que tanto gosto. O velho gira-discos
ficara também a apodrecer em casa do pai...Não hesitei portanto,
comprei-o logo. Este cd aparece agora, decerto devido ao labor
de uma gente que deve ser fã devota de Durutti Column, pois foi
remasterizado digitalmente a partir do próprio vinil. As fitas
originais devem estar algures por aqui, porventura perdidas,
neste paisanito à beira-mar achaparrado...Este disco foi uma das
poucas edições da saudosa, e nossa, Fundação Atlântica, aventu-
ra demasiado oudada e fugaz levada a cabo pelo Miguel Esteves
Cardoso, nesses distantes anos 80. Só foram editadas 4000
cópias. A minha é uma delas. Uma pequena pérola.
Ouvi-la hoje, tantos anos depois, soube-me a lágrimas.
Ou melhor, pôs-me o corpo todo a chorar. Um frémito de
nostalgia.
Lembrar essa espécie de spleen dos meus verdes anos...
Lembrar que lhe dediquei um texto, escrito a vermelho no
próprio encarte interior. Uma espécie de carta arrebatada.
Aqui a deixo. Era inverno, estávamos a curtos dias do natal.
A chuva é mais forte do que tu, meu amigo Vini Reilly.
Soa mais forte que a tua guitarra, a mim que para aqui
estou sozinho, mal acomodado entre jornais e almofadas,
entre jograis e boçais fadas...
Sentiste Lisboa, meu bom amigo...Olha que eu já nem
sinto o meu Porto...
Cidade maldita que me fechou as portas. Já não sinto
sequer o próprio país. Terra que me fechou tudo. Todo.
E a chuva a cair...sempre impiedosa.
Bonito presente de natal o teu.
Ah, como eu gostava de ter uma amada Jacqueline...
Ah, como eu precisava de uma amante Lisboa...
Uma guitarra ou uma menina ao pé da piscina...
Quem me dera um vestido amarrotado.
Ou mesmo a melodia triste de um fado.
Ao pé de ti, sinto-me irmão teu, a mesma magreza,
a melancolia sem fim, invejo até a tua camisola...
A chuva...the same again...
I love you...it's so easily...
A tua música a fazer-me sonhar. Uma noite chuvosa como esta.
As mãos geladas, whisky sem gelo, muito.
A meu lado, uma mulher inanimada e pateta...but sometimes
the dreams are more beautiful...
Com a tua música sinto saudades. Sinto-me na brisa de um
vento fresco, no ondular tranquilo de um lago no verão.
Sinto saudade da minha saudável infância.
E também tu, amigo, já sabes nomear a saudade.
Mas a chuva...
Se não ouço os teus beijos pianíssimos, fraternas melodias arre-
metidas contra a solidão e seus donos, não é por culpa da suavi-
dade bela da tua música, ou da tua frágil sensibilidade.
É mesmo por causa da chuva que cai ruidosa. Implacável.
Também é já tarde na noite, o volume do som está baixinho
porque há gente a dormir.
Gente que ignora o prazer dos homens solitários na sua relação
com a noite, a sua demanda por uma alvorada redentora, um
qualquer alvoroço luminoso na alma...
Men like us...
Thanks, Vini, for your "Amigos em Portugal".
Devo acrescentar que nunca consegui uma camisola igual à dele.
Duas ou três namoradas ainda prometeram, com mais ou
menos paixão, com menor ou maior empenho, fazê-la de suas
próprias mãos. Chegou-se a comprar lã e agulhas de tricot.
A escolher a cor...Chegaram a tecer-se algumas meadas, mas...
mas o tempo emaranhou-me a memória...
Perdi o fio à meada.
Sei que um dia comprei uma que me fez lembrar tudo isso.
Mas era apenas parecida.
1 Comentários:
Olá Francisco,
Estou quase certo que és aquele meu colega que andou em Eng. de Minas e que queria fazer filmes. E que escreveu no encarte do "Amigos em Portugal" um texto que transcrevi para a cassete que a partir dele gravei. E que um dia teve um diálogo seu lido pelo BB em directo na rádio.
Ainda hoje adoro Durutti Column e herdei-o de ti.
Se me quiseres contactar o meu mail é pcal arroba sapo.pt
Abraço
Pedro C alheiros
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