30 abril, 2007

Cartilha da cura, de Ana Cristina César

As mulheres e as crianças são as primeiras que
desistem de afundar navios.

29 abril, 2007

meu norte

Photo Sharing and Video Hosting at Photobucket
© Abril 2007

27 abril, 2007

músicas do acaso


© 2007 (imagem e som registados por câmara fotográfica digital)

26 abril, 2007

O Homem de Abril, de António Ramos Rosa *

Eis o homem de Abril.
Nasceu fraco e de pé.
De fraco, fez-se velho.
Fez-se velho a valer.

Sentou-se ao pé de um muro.
Atrás o sol nascia.
Uma rosa rompeu.
Era manhã. Bom dia!

(* poema dedicado pelo autor a José Gomes Ferreira)

25 abril, 2007

Devolução dos Cravos, de Joaquim Castro Caldas

um menino uma vez
o tal que há em nós
sujo de liberdade
todo na ponta dos pés
tentou enfiar um cravo
no cano de uma G-3

hoje um homem talvez
menino velho sem voz
democrata que se farta
mete o cravo na culatra
e puxa-a de pé atrás
com medo que o seu país

(do livro "Convém Avisar os Ingleses", Quasi Edições, 2002)

24 abril, 2007

o mentiroso desta manhã

Tudo podia ser
o vazio nesta manhã.
O mentiroso desta bela manhã.

A manhã está já presente
na dor cava
de quem ainda dorme.
Esgotado o encontra.

Acorda.
Na luz da fala vai acordando,
permitindo o nascente sol enorme
que trará os estigmas, os sons, imagens.
Sobre a secretária quotidiana atulhada,
inúmeros papéis e números inúteis.

O ventanoso rosnar dos ventiladores,
a proximidade do caos de todos os dias
do trânsito rodoviário,
a faina miserável das gaivotas
nas patéticas cascatas de esgotos
que a cidade tonta vomita no rio,
uma ou outra tosse, ecos
do ardor implacável de um inverno atrasado,
o som rilhado dos computadores
na impressão automática das palavras,
anjos do uso de todos os deuses.

O rio,
sensualidade, solidão.
O rio refulgindo a cinza do tempo,
a cinérea cor das pedras.
Rio de ouro de insensatos lumes,
espelho velho de miragens.

Desfaço-o. Eu não vejo nada.
Atiro às águas o resto de uma maçã.
O impúdico riso das gaivotas devorado,
esquecido nos limites do círculozinho de ondas
prestidigitado.

Pouco se avista também da outra margem.
Uma casa solarenga, talvez freixos,
todas as árvores de aparência lacrimejante,
um breve estuário eternizando o tempo.

Dali veio um homem
já falecido há muitos anos
morrer perto de nós.
Mas não se sabe bem. Não se sabe completamente.
Pública voz que diz
o que quer de quem morre.
Ignaras aves.

Estas manhãs.
Tudo podia ser o que sei
desta manhã.
Sono. Um assassino sono
porfiando na cegueira do olhar.
O apagamento.

Sou sincero,
confesso as garras,
retomo o poema no
descrédito das horas.
Um cavalo metáfora de fantasmas,
lúcidas esporas,
almejando a sombra da lua
onde insinuar os cios, os ciúmes,
a língua truculenta de um comboio.

Ilusão virginal a desta manhã,
no trigo não haver joio,
horas inconfessáveis a dobar
e a dobrar as palavras,
arisco sobre o tempo
arrisco sulcar a memória,
dotar, domar
os ígneos enigmas da vontade.

Tudo podia ser o vazio,
nestas manhãs de tantas sirenes
a magoar.

23 abril, 2007

livros que me pertencem, II

Photo Sharing and Video Hosting at Photobucket

livros que me pertencem, I

Photo Sharing and Video Hosting at Photobucket

20 abril, 2007

Projecto de Sucessão, de António Maria Lisboa

Continuar aos saltos até ultrapassar a Lua
continuar deitado até se destruir a cama
permanecer de pé até a polícia vir
permanecer sentado até que o pai morra

Arrancar os cabelos e não morrer numa rua solitária
amar continuamente a posição vertical
e continuamente fazer ângulos rectos

Gritar da janela até que a vizinha ponha as mamas de fora
por-se nu em casa até a escultora dar o sexo
fazer gestos no café até espantar a clientela
pregar sustos nas esquinas até que uma velhinha caia
contar histórias obscenas uma noite em família
narrar um crime perfeito a um adolescente loiro
beber um copo de leite e misturar-lhe nitro-glicerina
deixar fumar um cigarro só até meio

Abrirem-se covas e esquecerem-se os dias
beber-se um copo de oiro e sonharem-se índias.

19 abril, 2007

o sal do sal*



*dedicado a A.R. pela sua coragem, pelo seu exemplo de vida,
pelo doce e venturoso sorriso que tudo merece.

e obrigado, Alberto, pelo privilégio de encontro tão memorável.
fico a torcer pela vossa inquietude...

18 abril, 2007

Ego, um poema de Régis Bonvicino

Ego desprega
sereia e caveira

Narciso
de um eu

impreciso Bosch
na altura da clavícula

Espécie de cogito
do signo incógnito

Homem sem sombra

Na pele,
corpo em torno do quase nada

17 abril, 2007

âmago

Photo Sharing and Video Hosting at Photobucket
"Âmago", impressão, caixa de madeira, acrílico e vinil
Joana Rêgo, 2007


É para mim um prazer quase desmedido, como que intangível,
este meu espaço cumprir a sua vocação de galeria virtual, ao ter o
envaidecido privilégio de poder apresentar-vos, quase em pri-
meira mão, um dos trabalhos mais recentes da artista Joana Rêgo.

16 abril, 2007

fado alexandrino

fatal cantilena num tom lapidar
fado menor de um pobre esteta:

há tanto mar e tão pouco amar
no fogo fátuo e letal do planeta

labor burguês no remanso do lar
a voz silente saltando da gaveta

ardor e dor no doce choramingar
canto amargo no âmago do poeta

15 abril, 2007

dois anos da casa de todas as músicas

Photo Sharing and Video Hosting at Photobucket
© Porto, Abril 2007

14 abril, 2007

sofia

Photo Sharing and Video Hosting at Photobucket
© Faro, 2006

dedicado à Patrícia e ao Rui, que acabam de trazer mais beleza
ao mundo.

13 abril, 2007

e que seu coração agora no sol levite

um mestre que devia ser ensinado bem cedo nas escolas a todas
as crianças. é de pequenino que bem se pode subverter o mais
comezinho destino.

Photo Sharing and Video Hosting at Photobucket
Sol LeWitt, Untitled DOW(Doctors of the World), 2001

Sol LeWitt (1928-2007)

Photo Sharing and Video Hosting at Photobucket

Sentences on Conceptual Art by Sol Lewitt

1.Conceptual artists are mystics rather than rationalists. They leap
to
conclusions that logic cannot reach.
2.Rational judgements repeat rational judgements.
3.Irrational judgements lead to new experience.
4.Formal art is essentially rational.
5.Irrational thoughts should be followed absolutely and logically.
6.If the artist changes his mind midway through the execution
of
the piece he compromises the result and repeats past results.
7.The artist's will is secondary to the process he initiates from idea
to completion. His wilfulness may only be ego.
8.When words such as painting and sculpture are used, they connote
a whole tradition and imply a consequent acceptance of this tradition,
thus placing limitations on the artist who would be reluctant to make
art that goes beyond the limitations.
9.The concept and idea are different. The former implies a general di-
rection while the latter is the component. Ideas implement
the concept.
10.Ideas can be works of art; they are in a chain of development that
may eventually find some form. All ideas need not be made
physical.
11.Ideas do not necessarily proceed in logical order. They may set one
off in unexpected directions, but an idea must necessarily be comple-

ted in the mind before the next one is formed.
12.For each work of art that becomes physical there are many

variations that do not.
13.A work of art may be understood as a conductor from the artist's

mind to the viewer's. But it may never reach the viewer, or it may
never leave the artist's mind.
14.The words of one artist to another may induce an idea chain, if

they share the same concept.
15.Since no form is intrinsically superior to another, the artist may

use any form, from an expression of words (written or spoken) to
physical reality, equally.
16.If words are used, and they proceed from ideas about art, then

they are art and not literature; numbers are not mathematics.
17.All ideas are art if they are concerned with art and fall within

the conventions of art.
18.One usually understands the art of the past by applying the

convention of the present, thus misunderstanding the art of the
past.
19.The conventions of art are altered by works of art.
20.Successful art changes our understanding of the conventions

by altering our perceptions.
21.Perception of ideas leads to new ideas.
22.The artist cannot imagine his art, and cannot perceive it until
it is complete.
23.The artist may misperceive (understand it differently from the

artist) a work of art but still be set off in his own chain of thought
by that misconstrual.
24.Perception is subjective.
25.The artist may not necessarily understand his own art. His
perception is neither better nor worse than that of others.
26.An artist may perceive the art of others better than his own.
27.The concept of a work of art may involve the matter of the

piece or the process in which it is made.
28.Once the idea of the piece is established in the artist's mind

and the final form is decided, the process is carried out blindly. There
are many side effects that the artist cannot imagine. These may be
used as ideas for new works.
29.The process is mechanical and should not be tampered with. It
s
hould run its course.
30.There are many elements involved in a work of art. The most
important are the most obvious.
31.If an artist uses the same form in a group of works, and changes

the material, one would assume the artist's concept involved the
material.
32.Banal ideas cannot be rescued by beautiful execution.
33.It is difficult to bungle a good idea.
34.When an artist learns his craft too well he makes slick art.
35.These sentences comment on art, but are not art.


First published in 0-9 (New York), 1969,

and Art-Language (England), May 1969

12 abril, 2007

Ave Maria, um poema de Frank O'Hara

Mães da América
deixem os vossos filhos ir ao cinema!
tirem-nos de casa sem eles saberem o que planeais
é certo que o ar livre é bom para o corpo
mas quanto à alma
que cresce na escuridão, adornada por imagens prateadas
e quando envelhecerdes como tendes de envelhecer
não vos hão-de odiar
nem criticar nem hão-de saber
estarão nalgum país encantador
que viram pela primeira vez numa tarde de Sábado
ou de gazeta

talvez até vos agradeçam
pela primeira experiência sexual
que só custou um quarto de dólar
e não perturbou a paz do lar
saberão de onde vêm os rebuçados
e os sacos de pipocas gratuitos
tão gratuitos como sair antes de o filme acabar
com um estranho agradável cujo apartamento é no
Céu na Av. Terra
perto da Ponte Williamsburg
ó mães tereis feito tão felizes
os putos porque se ninguém os apanhar no cinema
não aprenderão a diferença
e se isso acontecer será puro gozo
e de qualquer forma ter-se-ão divertido a valer
em vez de vagabundearem no pátio
ou no quarto deles
odiando-vos
prematuramente pois que ainda não fizestes nada horrivelmente

maldoso
excepto mantê-los afastados das alegrias mais sombrias
o que é imperdoável
portanto não me culpem se não seguirem este conselho
e a família se desunir
e os vossos filhos ficarem velhos e cegos frente à televisão
vendo
filmes que não os deixastes ver quando eram novos


(do livro "vinte e cinco poemas à hora do almoço" com
tradução de José Alberto Oliveira, Assírio & Alvim, 1995)
(nota: não consegui seguir aqui a disposição gráfica

original do poema)

11 abril, 2007

4:40

Vamos lá, meus amigos, toca a fazer filmes!

Photo Sharing and Video Hosting at Photobucket

Uma verdadeira corrida contra o tempo é o que propõe "4:40",
uma competição de curtas-metragens criada pela Associação de
Estudantes da Escola das Artes da Univ. Cat. Portuguesa, cuja
primeira edição acontecerá no âmbito do 4º Festival Audiovisual
Black&White, a decorrer no Porto de 19 a 21 de Abril de 2007.

Photo Sharing and Video Hosting at Photobucket

Escrever, produzir, filmar e editar um vídeo até um máximo de
4 minutos, em apenas 40 horas!
Vamos lá pegar nas câmeras!
Vamos lá aceitar tão inusitado desafio!
Vamos lá fazer fitas!

As inscrições são livres, mas o tema não.
O tema será dado a cada equipa aquando a inscrição e será
divulgado apenas às 10 horas do dia 19 de Abril.
As equipas concorrentes deverão ter os filmes concluídos,
conforme o tema, até às 02 horas do dia 21 de Abril.
A escolha, a divulgação dos vencedores e a exibição pública dos
filmes decorrerão durante o mesmo dia 21.
Para além de um Grande Prémio existem ainda as categorias
de Melhor Edição, Melhor Argumento e Melhor Fotografia.
Mais informações sobre o regulamento aqui:
http://www.artes.ucp.pt/B&W/440/4_40siteFinal.swf

10 abril, 2007

the good girl's stories

Photo Sharing and Video Hosting at Photobucket
"visiting my self" e "esperar novos dias", de Evelina Oliveira


"The Good Girl's Stories", uma exposição de pintura, a ver na
Galeria Ao-Quadrado, em Santa Maria da Feira, até 30 de Abril.

"Enredadas na memória, as telas expostas constituem uma viagem da pintora
na sua própria vida, sabendo nós que as soluções forjadas na infância e os
expedientes criativos podem regressar mais tarde em momentos imprevistos.
Há uma marca que fica inscrita no modo como encaramos o mundo e a vida;
e a matriz de Evelina Oliveira na criação plástica é certamente tributária desse
tempo em que as bonecas de papel protagonizavam histórias entre o mais
aventuroso ou o mais recatado. As figuras, ou a figura feminina, porque se
trata quase sempre de uma figura feminina, evocam, naturalmente, a infância
de filha única, o tempo de solidão povoada por histórias inventadas, de brin-
cadeiras improvisadas, de esperas intermináveis e férias muito longas que
faziam funcionar a imaginação e a criatividade.
A sua pintura recupera as bonecas de papel e reactualiza a sua imagem nas

figuras recortadas que preenchem este universo um pouco sombrio e nem
sempre isento de indícios sinistros. Como nada volta ao que já foi, o resgate
de sinais do passado é filtrado pelo olhar do presente, daí a ambiguidade e o
carácter enigmático das figuras e das situações sugeridas. Boas ou más?
Anjos ou demónios? Receosas ou curiosas? Aguardam ou actuam?"

Laura Castro (excerto do texto da exposição)

09 abril, 2007

Desinferno II, poema de Luiza Neto Jorge

Caísse a montanha e do oiro o brilho
O meigo jardim abolisse a flor
A mãe desmoesse as carnes do filho
Por botão de vídeo se fizesse amor


O livro morresse, a obra parasse
Soasse a granizo o que era alegria
A porta do ar se calafetasse
Que eu de amor apenas ressuscitaria

08 abril, 2007

a paz coada

Photo Sharing and Video Hosting at Photobucket
aguarela de Tiziana Bonazzola, 1989, retirado de uma carta
para seu filho, meu amigo Moloi

07 abril, 2007

mobilephotos

Photo Sharing and Video Hosting at Photobucket


"Reflexo de um livro com o mesmo nome, «De passagem» é a
primeira exposição de fotos de telemóvel de Omar Cleunam
(França, 1977). A mostra inclui pequenos e grandes formatos,
impressos em papel e em tela, que sugerem, pelo movimento
e pela desfocagem que este provoca, a passagem humana sobre
a Terra. Misteriosa, rápida, em movimento contínuo, em in-
terrogação permanente.
Para o autor esse é precisamente o tempo da recriação, da
reconstrução, do reencontro."

Não conheço absolutamente nada sobre o autor, mas despertam-
-me alguma curiosidade os conceitos com que o autor partiu para
esta série de trabalhos. Tentarei ver. Não conheço o autor mas
conheço a nova GESTO, um espaço que vale a pena visitar, em
plena baixa do Porto.

06 abril, 2007

o criador queria a dor

Qual criador, qual carapuça!
Deus apenas e só
criou dor.
Meteu a pata bem na poça!
Deu-nos um mundo
bem mal
criado.
Desabrigado.
Atolado
numa espiral
de infernais utopias.
Deu Deus?
Terá dado
mas eu não digo
obrigado.

05 abril, 2007

sound of light



o maravilhoso mundo de Takagi Masakatsu...
pintura em movimento. pintura do movimento.
pintura para além da pintura.
como encher de cor o vento?
como encher de cor a beleza que o coração pressente?
como se move a música no mais cristalino silêncio?
como se dá cor às mais belas notas de uma música perfeita?

(ah!... e quando for grande quero dominar assim o meu mac,
passe a publicidade à irresistível maçã...)

04 abril, 2007

circo de fábulas



Como gostava eu hoje de poder estar à noite em Braga...

Photo Sharing and Video Hosting at Photobucket

03 abril, 2007

penso logo santo estive

Photo Sharing and Video Hosting at Photobucket
© 2007

02 abril, 2007

apanhar ideias

"Pode explicar como é que se concebe um filme como
"INLAND EMPIRE"?
Apanho ideias. É como pescar. O desejo por uma é como um

isco no anzol. Deseja-se algo e, se se for paciente, provavel-
mente apanha-se uma ideia. Quando ela vem, se me apaixono
por ela, guardo-a. Pode ser só um fragmento, mas fico com
ela - e espero que ela mesma atraia outras ideias.
(...)
Mas é um processo de livre associação de ideias?
Não exactamente. Tudo começa por uma ideia. Um clarão,
um pouco de luz, como nos «cartoons». E aí está. Nunca sei a
dimensão da ideia até a pôr no papel.
Como nos «cadavres exquis» dos surrealistas?
Mas é sempre assim que se fazem os filmes... Talvez haja quem
tenha o filme inteiro numa única ideia, mas a maior parte dos
cineastas têm uma ideia e depois outra e outra e a história
começa a tomar forma. O processo é sempre esse. Surrealista?
Sim, com certeza. Nem sempre as coisas são perceptíveis com
o intelecto, há coisas que se sentem, que se intuem. E a intuição
é uma coisa boa em termos de conhecimento. Na vida quotidiana
usamos a intuição constantemente, mas no cinema não estamos
muito habituados a fazê-lo."

(excerto da entrevista de Jorge Leitão Ramos a David Lynch,
no suplemento "Actual" do "Expresso" de 31/Março/2007)

01 abril, 2007

cidade do sol

Photo Sharing and Video Hosting at Photobucket
© 2007